Já li e ouvi tantas interpretações sobre a decisão do Tribunal Constituicional de impedir o corte de pensões aos reformados do Estado que fico meio abananado: como é que 11 dos 13 juízes assinam uma declaração de inconstitucionalidade (duas juízas votaram da mesma maneira mas com razões diferentes) e os políticos afetos ao Governo encontram ali argumentos para preparar outra proposta de lei que obtenha a finalidade agora falhada?
O melhor mesmo é citar o dito acórdão e a hipótese académica que ele abre: "Uma medida que pudesse intervir de forma a reduzir o montante de pensões a pagamento teria de ser uma medida tal que encontrasse um forte apoio numa solução sistémica, estrutural, destinada efetivamente a atingir os três desideratos (...): sustentabilidade do sistema público de pensões, igualdade proporcional e solidariedade entre gerações."
Mais à frente os juízes reforçam: "Será o sistema e seus valores, designadamente a garantia da sua sustentabilidade e a sua equidade interna, a conferir sentido aos sacrifícios impostos aos respetivos beneficiários, desse modo justificando-os e legitimando-os à luz do princípio da tutela da confiança."
Procuro alguém que seja capaz de construir um projeto de redução de pensões do Estado que assegure a sustentabilidade do sistema público, a igualdade proporcional dos sacrifícios pedidos aos beneficiários, a solidariedade geracional, a equidade dos valores praticados e, ao mesmo tempo, não rompa a confiança entre Estado e cidadãos pelo fim das garantias anteriormente dadas. Olho e, simplesmente, não me parece possível encontrar tal génio que desenhe a impossível quadratura desse círculo. E, aposto, não será viável esse hipotético projeto obter consenso jurídico suficiente para ser viabilizado.
O que isto quer dizer, tornando simples a preposição colocada pelos juristas do Palácio Ratton, parece-me evidente: não é possível aplicar um corte repentino e significativo às pensões pagas aos aposentados da função pública (e aos outros também) sem provocar uma ou várias injustiças. Ora, por definição, nenhum tribunal pode validar injustiças, muito menos o guardião da Lei Fundamental.
Na ânsia de resolver a crise financeira do Estado o atual poder entende que cometer injustiças é apenas um meio para atingir um fim. Passos Coelho, que há dois anos e meio tomou posse, não percebeu que esse raciocínio, iníquo, acabaria na morte da gestão política que o eleitorado validou. Aparentemente, ao prometer voltar à carga, nem sequer entende que agora é a sua própria sobrevivência política pessoal que está em causa. Por mim, ainda bem.
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