Estava a pensar na reunião do Conselho de Estado que ontem ocupou o Presidente da República. Aceitando de barato a agenda tornada pública, mais ou menos validada por dois membros da simpática sinecura que se dedicam à atividade bem mais lucrativa e prestigiante do comentário político em canal televisivo de sinal aberto, ter-se-á discutido o Portugal do pós-troika, o destino a dar ao pouco que sobrará da chacina financeira em curso .
Para visionar esse futuro, a um ano e picos de distância, se tudo correr como previsto - o que seria extraordinário, pois nos últimos dois anos nada do que a troika e o Governo programaram veio a acontecer, a não ser a espoliação generalizada dos bens dos cidadãos - temos sentado numa das 19 cadeiras reservadas a cérebros da Nação, aceites em Belém, um brilhante neurologista.
Estou a referir-me a João Lobo Antunes, especialista em hipotálamo e hipófise. Esta glândula, não sei se o leitor sabe, é uma das responsáveis pelo crescimento e secreção do leite através das mamas.
Talvez seja essa a última esperança de Cavaco Silva, talvez espere que dali venha uma ideia qualquer para o País voltar a fornecer-se numa teta generosa, como fez cinco séculos nas colónias e 25 anos na União Europeia.
A não ser esse eventual milagroso contributo, muito duvidoso, não vejo nas competências dos restantes conselheiros algo que possa motivar ao Presidente, em particular, e ao cidadão, em geral, uma remota possibilidade de vislumbrar um futuro qualquer, quanto mais um futuro melhor.
Talvez se um astrólogo ocupasse uma daquelas cadeiras - no meio dos juristas, gestores, militares, economistas, poetas, médicos e políticos que lá estão - essa discussão sobre o futuro pudesse fazer algum sentido. Assim, trata-se de um exercício teórico estimável mas certamente pueril.
(Aparte: não há um único engenheiro no Conselho de Estado! Certamente não deve fazer falta ao futuro ter ali alguém que saiba construir coisas que se vejam.)
Porque estou tão cético? Bom, amanhã , dia 22 de maio de 2013, temos a certeza que ainda há Governo? Temos a certeza que ainda há euro? E União Europeia? E já nem lhe pergunto sobre o seu futuro pessoal, caro leitor ou leitora...
Dar palpites sobre o pós-junho de 2014 é, hoje, face à realidade concreta, um ato grotesco, é alimentar a ilusão de que estamos a resolver os problemas quando, manifestamente, os agravamos. Essa ilusão, essa finta à realidade que o Presidente e os conselheiros ontem, se mais nada se passou, exercitaram, não serve o País, nem hoje nem no hipotético futuro.
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