A questão moral de Maria Luís Albuquerque

Maria Luís Albuquerque protagoniza um velho problema moral da política portuguesa? Sim. A tradição a que me refiro não está, porém, na mentira que ela terá dito numa Comissão Parlamentar de Inquérito (aparte: peço desculpa, mas não vou escrever, hipocritamente, frases como "ter faltado à verdade" com que os políticos e os analistas bem comportados, cínica e politicamente corretos, têm descrito este problema).

Uma hipotética nova questão dos casos swap não é, com certeza, a de uma mentira dita por um governante em sede institucional: em 39 anos de democracia não é esta a primeira vez que os deputados são enganados nestes inquéritos. Mas será a primeira vez que uma ministra das Finanças é apanhada a mentir durante esse ritual solene.

Isso é, de facto, novo, mas não modifica o problema moral em si: quem mente de forma oficial aos representantes do povo não pode exercer funções oficiais em representação desse povo. Há muito que esta relação está apreendida e o resultado lógico e coerente desse entendimento seria a decorrente demissão de Maria Luís, exigida pelos partidos de oposição.

O que é novo, do ponto de vista moral, vem agora: não fosse este caso suscitado numa altura em que os dirigentes do País hipotecaram a sua própria conduta ao que entendem ser a satisfação das necessidades da crise e, obviamente, a senhora ministra já não o era. Este falso estado de guerra desculpa tudo, como verificámos nas últimas semanas. Aquilo que antes da crise era condenável passou agora a ser um serviço prestado ao País... Os governantes perderam a vergonha e as consequências serão desastrosas para o regime.

Voltemos ao que é velho, ao que motivou esta crónica: o tradicional problema moral da política portuguesa, que se revela, mais uma vez, com as swap e, antes, se evidenciara com as PPP, o BPN, a traficância política de empregos em empresas públicas e, até, privadas, certas gestões de certas empresas públicas e municipais e inúmeras outras tropelias. Estes escândalos ocorrem sempre pelos mesmos dois motivos - pessoal político que quer gastar dinheiro sem ser democraticamente controlado e pessoal financeiro sempre disposto a criar condições para isso, garantindo, no final da linha, proveitos anormais, pagos pelos contribuintes.

Este sim é o velho problema moral: a política que se verga ao dinheiro. Melhor do que discutir na Assembleia da República a moral da ministra Maria Luís seria debater a forma de pôr um fim a esta promiscuidade que, em última análise, criou a crise onde todos sofremos. Mas, por aí, haveria muito moralista que sairia a perder.

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