Foi em Setembro de 2004. Dias depois de os dois jornalistas tomarem posse como administradores, chamaram-me. O problema era este: tinha de reduzir despesas. A solução era esta: cortar nas colaborações externas, de forma radical. Eu que decidisse como... É um velho clássico da vida dos jornais.
Uma semana depois, apresentei o relatório sobre o cumprimento dessa missão. Agradeceram-me a presteza e nunca mais me maçaram. Pelo contrário, começou, quer com o Mário quer com o Luís, uma relação
pessoal mais do que simpática. E uma actividade profissional bastante frutuosa para o 24horas, que lhe garantiu prosseguir o caminho de êxito que, na altura, atravessava.
Aquele facto tem associado um outro pormenor relevante: os três temos posições políticas antagónicas. Passe o simplismo, poderemos dizer que o Luís é mais à direita, o Mário mais ao centro e eu mais à esquerda. Nunca isso foi problema entre nós, apesar de estarmos em desacordo sobre tanta e tanta coisa! Devo-lhes isso.
Confesso o infantil deslumbramento e o inevitável embaraço que interiormente sentia por andar "entre os grandes" do jornalismo. Eu explico: estar numa sala de reuniões a discutir assuntos profissionais, taco a taco, com dois dos homens mais influentes da história recente do jornalismo português enchia-me o ego, por um lado, e intimidava-me, por outro. "Afinal", perguntava em segredo a minha consciência moral, "quem és tu para estares aqui a mandar bitaites ao Mário Bettencourt Resendes? Como te atreves, pá?!"... E não tinha uma boa resposta para dar!
"E agora?", volta a maldita consciência a atormentar-me, "como tens lata para escrever no jornal que ele dirigiu, o jornal que ele simbolizou?". E, inevitavelmente sem resposta, prossigo nesta desfaçatez...
A curta e insignificante história da minha relação com Mário Bettencourt Resendes só tem hoje importância pelo simbolismo deste facto: para os jornalistas da minha geração ele personifica uma grandeza e um estatuto que, temos consciência - por muitos êxitos que somemos, por muito brilhantes e talentosos que parecermos, por maior que seja a repercussão que tenhamos -, nunca iremos alcançar. E isso diz tudo sobre a tristeza para o jornalismo português de perder Mário Bettencourt Resendes.
in “Diário de Notícias”, 3 de Agosto de 2010
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