Uma ironia do destino...

Quando me demiti da direcção do 24horas, há um ano, recebi elogios públicos de apenas três pessoas: Ruben de Carvalho (é suspeito pela amizade que temos), Luís Delgado e Clara Pinto Correia.
Agora, após o fecho do jornal, recebi um elogio, totalmente inesperado, de Óscar Mascarenhas, antigo presidente do Conselho Deontológico e o melhor especialista nesta matéria que temos em Portugal.
É uma ironia receber este elogio, de onde não esperava, após tantas omissões pelo silêncio, de onde também não esperava.
Reproduzo o artigo do Óscar, que muito me sensibilizou, publicado no Jornal de Notícias a 5 de Julho passado com o título "O nome do palácio":
"O 'Público' e o 'Diário de Notícias' titularam algo como: «Primeira visita oficial do Presidente Cavaco Silva é ao Hospital da Estefânia.» O '24Horas' fez diferente: «Cavaco visita Hospital da Estefânia para pagar
promessa de lhe terem tratado bem um neto.» Uso muitas vezes esta comparação para mostrar a alunos de jornalismo que não é certo que o público saia mais bem informado com jornais ditos de referência do que com a imprensa popular. Com a notícia do '24Horas', os leitores ficaram com mais elementos para um livre juízo de valor: uns ter-se-ão enternecido com os sentimentos do avô Presidente; outros terão ficado empedernidos, considerando a razão da visita uma exorbitância da função presidencial.
(A (des)propósito: o '24Horas' acabou. Deixa-me saudades o tempo em que foi dirigido por Pedro Tadeu, exemplo vivo de que um jornalista culto e com referências éticas pode fazer a diferença num jornal popular - por muitos deslizes que tenha cometido e de que era o primeiro a reprovar-se em público, caso ímpar na nossa imprensa.)
Desde o primeiro dia que era antecipável o modo como Cavaco iria estar na Presidência. Bastava ver a imagem 'kitsch', fora da genuinidade republicana, da entrada de Sua Excelência, com toda a família de mão dada, no Palácio de Belém. Tão felizes estavam que imaginei que, não fosse a rampa a subir, toda a 'primeira família' correria, como futebolistas contentes, para se atirar depois ao chão deixando-se escorregar… Mas cada um fará o seu juízo.
Mais recentemente foi o aproveitamento da visita do Papa para a bênção aos netos numa recepção formal no palácio presidencial. Os funcionários, ali à mão, não tiveram o mesmo privilégio de serem directamente abençoados por Sua Santidade.
Pudera, não pertencem à 'primeira família'! Mas cada um fará o seu juízo. Finalmente, a caricata explicação da não comparência nas cerimónias fúnebres de José Saramago. Lá vieram os netinhos à baila, pelos vistos rentável material de exploração eleitoralista da figura do avô extremoso. Mas cada um fará o seu juízo.
E lembrarmo-nos de que os adversários de Mário Soares atacaram a sua última candidatura presidencial mandando-o ir para casa tratar dos netinhos! O seu rival fez o dois-em-um: foi tratar dos netos - para o palácio.
Temo bastante que, se o homem vier a ser reeleito, perca de vez o sentido das proporções e determine que o palácio presidencial passe a denominar-se Palácio Mariani & Netinhos. Mas cada um fará o seu juízo."








Sem comentários:

Enviar um comentário