O mundo secreto das grávidas

Há uma fase na gravidez das mulheres de tal maneira enternecedora que nos dá uma vontade quase irreprimível de as enchermos de miminhos. É numa altura em que a barriga delas parece uma pequena bola, de vez em quando acariciada, com toda a suavidade, pela macieza maternal de umas mãos ligeiramente papudas. De resto, todo o corpo delas já inchou um bocadinho, mas ainda não é um peso, parece apenas ter decidido chamar a atenção do mundo para reclamar o direito a sorrisos de cumplicidade dos transeuntes: “Olha, que giro! Vai ali uma grávida”, parecem exclamar, inevitáveis, os sorrisos nas caras dos que se cruzam com essas mulheres. Mas elas, metidas consigo mesmo, passam indiferentes aos olhares dos outros, obcecadas em ver para dentro de si próprias, em ouvir, em tactear, em cheirar, em saborear a invasão que ocupou tudo aquilo que elas são. E, por sua vez, sorriem, sorriem muito, vá lá saber-se claramente porquê.

Aqui na redacção há, neste momento, três mulheres a atravessar essa fase mansa da gravidez. Cada vez que tenho de falar com alguma recebo um ligeiríssimo sobressalto, como quem acorda de um sono ligeiro. Sinto sempre que estou a interromper qualquer coisa que não devia, mas lá ponho a minha carantonha de director e trato dos im-por-tan-tís-si-mos afazeres profissionais que motorizam a minha vida. Mas, claro, elas relativizam a minha pressa, a minha ansiedade, porque acerca de coisas verdadeiramente importantes, agora, elas é que sabem tudo, não eu. E lá ando, pequenino, humilde, a pedir atenção e o favor de, no intervalo dos segredinhos com a barriga, elas escreverem a noticiazinha de capa deste jornal...

Bom... Acho que vou ali fazer uma escala de serviço para as mulheres desta redacção engravidarem à vez...

in 24horas, 15 de Julho de 2006

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