Foi consensual destruirmos inúmeras produções na indústria, na agricultura e nas pescas. Foi consensual passar a viver de crédito bancário. Foi consensual construir autoestradas, a Expo 98, o Euro 2004. Foi consensual deixar as câmaras municipais licenciarem selvas urbanísticas.
Foi consensual deixar crescer o Estado de uma maneira clientelar, corrompendo o seu papel na sociedade. Foi consensual desvalorizar a profissão de político até a tornar atraente, apenas, a malucos idealistas ou a imbecis carreiristas.
Foi consensual enriquecer a banca, transformando cada família na dona da dívida de uma casa paga a 30 ou 40 anos.
Foi consensual desproteger os trabalhadores, descapitalizar a Segurança Social, estabelecer parcerias público-privadas, colocar na gestão das empresas públicas os amigos do poder, entregar a parte lucrativa dos serviços de saúde ao investimento privado. Todos aceitaram que o Estado fosse explorado pela indústria farmacêutica.
Foi consensual, em nome da defesa da independência dos tribunais, deixar a Justiça suicidar-se. E também se achou bem acabar com o Serviço Militar Obrigatório ou culpar os professores pela balbúrdia curricular.
Foi consensual aplaudir a assinatura do Tratado de Lisboa, que prometia colocar a Zona Euro na liderança da economia mundial (que anedota!). Foi consensual apoiar a invasão do Iraque. Foi consensual nacionalizar o crime BPN. Foi consensual, até a meio do primeiro mandato de Sócrates, deixar crescer o défice e a dívida.
Foi consensual entregar a soberania portuguesa ao diretório europeu. Foi consensual governar sob a batuta de maestros formados no conservatório da ganância financeira. Foi consensual apoiar efusivamente o memorando da troika. Foi consensual aceitar a austeridade como inevitável e o acordo de concertação social que a caucionou... E é, agora, consensual criticar tudo o que antes se apoiou!
As forças partidárias e sociais, erradamente apelidadas de "responsáveis" - PSD, PS, CDS, UGT, CIP, CCP e CAP -, que protagonizaram o essencial (com momentâneas birras inconsequentes) deste consenso com 30 anos, estão a ser empurradas, mais uma vez, para um entendimento.
Consenso é a ordem, o credo, dos donos do sistema, como se a palavra fosse sinónima de bom senso. Mostra a experiência, afinal, que consenso significa apenas senso comum, o senso míope que desmoraliza e arruína o País.
Publicado no Diário de Notícias, 23 de Abril de 2013
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