Ser conduzido é que é bom

Tenho muita prática de andar no lugar do morto. Não conduzo, pelo que conduzi toda a minha vida na base de que alguém tem de me conduzir. Nessa forma tão original de condução sou particularmente habilidoso, pois ao longo de 42 anos nunca tive um acidente ou fiquei sequer apeado. Como piloto de boleias sou, portanto, um verdadeiro ás. E não tenho que me preocupar com percursos, combustíveis, documentos, revisões, estacionamento, polícias, peões, automobilistas ou seguros. 


Na minha vida pessoal e profissional tive assim oportunidade de viajar em todo o tipo de carros, desde os antigos 2 cavalos aos mais fantásticos Porsche, desde os Fiat 600 às limusinas de Estado da Mercedes. Apesar de não ter sequer a carta de condução, como arranjei sempre maneira de me levarem tornei-me um especialista: conheço, na prática e com exactidão, as virtudes e defeitos de uma grande parte dos carros que por aí circulam e de muitos outros modelos que já deixaram de circular. 


E posso testemunhar que cada comportamento automóvel corresponde, em 90 e tal por cento dos casos, ao comportamento dos seus donos condutores: sim, é verdade que um carro “nervoso” geralmente tem um tipo de espírito agressivo, imaturo ou inseguro ao volante, e que um modelo confortável, “macio”, mesmo “ronceiro” tem alguém satisfeito com a vida a acariciar suavemente a alavanca das mudanças. Como serão os compradores portugueses do Porsche Carrera GT que custa mais de105 mil contos? Eu digo: são danados para a brincadeira. 


Deles, não quero mesmo ter boleias. Andar na Terra a 330 km/hora ou chegar dos 0 aos 100 em três segundos e picos não é coisa humanamente suportável... Livra! 
in 24horas, 27 de Agosto de 2005

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