Desesperadas
por ficarem em casa

Nunca consegui interessar-me por uma rapariga que pensasse ser dona de casa. No meu tempo de adolescência e jovem adulto qualquer mulher que ambicionasse ser fada do lar era, no mínimo, imbecil. Como eu, que tinha a presunção de ser um tipo inteligente, juntava às minhas características pessoais a arrogância de não ter paciência para a estupidez, fugia a sete pés de todo o exemplar feminino que se dedicasse ao croché ou mesmo à moda de então: o suspeito mas equívoco (havia meninos a fazê-lo também) macramé. Portanto, a coisa marcou-me. 


Casei, portanto, com uma mulher inteligentíssima, o que teve inúmeras vantagens – entre elas a de poder discutir o reaccionarismo da “Metafísica do Amor” de Schopenhaeur – mas também alguns inconvenientes, entre os quais a de eu próprio ter passado muito mais tempo na cozinha do que alguma vez pensei na vida ou, numa altura de aperto financeiro, sem mulher-a-dias, ser obrigado a fazer da companhia do pano do pó um momento excitante das manhãs de domingo. 


De repente, de há uns anitos para cá, comecei a ver inúmeras mulheres com estatuto de inteligentes (com quem até se poderia discutir Karl Popper, que o Schopenhaeur, na galeria de reaccionários, já está fora de moda) a dizerem que querem regressar ao lar, cuidar das criancinhas, e viverem felizes para sempre, superprotegidas do mundo violento que anda lá fora.


Custa-me compreender esta mudança, num tempo onde a maioria das mulheres procura, em primeiro lugar, o êxito profissional. Mas a busca da felicidade é uma coisa muito pessoal. Sermos todos iguaizinhos, de resto, é que seria, mesmo, intolerável.
in 24horas, 23 de Julho de 2005

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