O jornal que quer ser uma revista

Mais de dez anos depois do seu nascimento, o 24 Horas operou uma profunda reformulação no seu formato e conteúdos, visível em banca desde o início desta semana.
Hoje o 24 Horas apresenta-se como um jornal mais próximo de uma revista. A começar pelo tamanho 25cmx35cm, quando antes apresentava um tamanho de 29cm x 37cm, mas também pelos conteúdos e a organização da equipa. A mudança, explica Pedro Tadeu, director do título, foi um processo muito “pensado e discutido” que há muito vinha a ser amadurecido no seio do jornal do grupo Controlinveste. A primeira vez que se começou a discutir a possibilidade de transformar o jornal num produto mais próximo de uma revista foi em Setembro de 2007, relembra o responsável.



“Fizemos vários focus groups, com vários jornais, com vários números zeros”, diz, de forma a perceber o impacto junto aos leitores do título a essa possível evolução. As reacções dividiram-se entre aqueles que se identificavam com o novo produto editorial e os que nem por isso, considerando haver alguma indefinição entre o produto jornal e revista. “Até encontrarmos o ponto de equilíbrio entre os conteúdos de um jornal e os de uma revista foi muito trabalhoso”, admite Pedro Tadeu.

Na altura os responsáveis acabaram por não optar pela transformação total do jornal, introduzindo as revistas no fim-de-semana. A decisão de avançar nesse sentido, revela Pedro Tadeu, foi tomada em Maio do ano passado, fruto “da pressão do mercado”, com os sinais da crise de imprensa a tomaram contornos mais definidos. “O cenário em torno do 24 Horas tornou-se mais complicado. Matérias do 24 Horas passaram a ser assunto noutros jornais pagos e tomámos a decisão de avançar com este projecto”, justifica o responsável. “Oito a nove números zeros” depois a equipa chegou ao actual formato.

Além de um novo tamanho, o novo 24 Horas apresenta-se agora em papel bright (o que implicou a mudança da gráfica Funchalense para a Mirandela) de 49g (anteriormente tinha 45 de gramagem) e dividido em apenas cinco secções. O jornal, explica Pedro Tadeu, passou a ser organizado como se de um telejornal se tratasse, ou seja, “o assunto é paginado consoante a sua importância”.

Em Notícias o jornal vai procurar dar “análise e não apenas relato puro” do facto noticioso. Em Factos são escolhidos “dois assuntos do dia que achamos que devem ser escalpelizados”, em Na Capa, desenvolvem, como o nome indica, o tema que faz manchete no jornal. Em Pessoas “vamos contar histórias de pessoas das várias áreas, sobretudo artísticas, mas também outras pessoas que se destaquem noutras profissões”. Em A Fechar, além da já habitual coluna do jornalista Joaquim Letria, surge Choque Frontal, coluna de opinião “onde dois jornalistas de áreas políticas de direita e de esquerda discutem, frente-a-frente, o mesmo tema”. Luís Delgado e Ruben Carvalho são os convidados. Na secção que fecha as páginas da publicação surgem também entrevistas, e informação sobre gadgets, entre outros conteúdos.

A reorganização da equipa

As mudanças ocorridas ao nível de conteúdos implicaram uma reorganização de toda a equipa do jornal a começar pela redacção. Uma reorganização da equipa do jornal que também contempla o corte dos quadros ocorrida com o processo de despedimento colectivo no grupo e que afectou o jornal em cerca de 10 profissionais, tendo levado ao encerramento da delegação do Porto. Hoje o jornal tem uma equipa de 38 redactores, 10 gráficos, quatro fotógrafos, um infográfico e seis profissionais de pré-press.

Para reflectir a lógica de planeamento à la telejornal, foram extintas as diversas editorias consolidando-as em apenas duas: Pessoas e Factos. Luís Fontes, Marco Alves e Nuno Fernandes são os editores-executivos da secção Factos, enquanto Ana Sofia Fonseca, Fernanda Mira, Lima Santos e Ana Carreteiro são as responsáveis pela Pessoas.

Os jornalistas Gonçalo Pereira, Marco Santos e Luís Nunes “fazem a edição e executam o noticiário do dia”, descreve Pedro Tadeu. Ana Meireles e Ricardo Simões Ferreira são os editores de fecho. Estruturas que reportam a Pedro Tadeu e Ricardo Martins Pereira.

Mas as mudanças afectaram igualmente o departamento gráfico. De uma equipa para o fim-de-semana (altura em que se produziam as revistas) e uma durante a semana, na nova organização há apenas uma equipa sob a coordenação executiva de Júlio Fernandes e Fernando Costa.

O novo modelo gráfico, criado por Rui Lisboa, implicou também aquilo que Pedro Tadeu descreve como uma mudança de “mentalidade”. Anteriormente, concretiza o responsável, “havia muito texto em cima da fotografia.

Tentamos no novo modelo que 99,9 por cento do texto seja agora preto-no-branco”. “Tem de ser um jornal muito arrumado, mas não pode perder o arrojo gráfico que caracteriza o 24 Horas”, continua Pedro Tadeu, considerando ter sido esse o principal desafio. “Todos os textos são separados entre si, no mínimo, um centímetro”, explica, com o objectivo de criar “zonas de branco e de respiração”.

Uma mudança gráfica que, acredita Pedro Tadeu, “é mais vantajosa para a fotografia, sobretudo, a de reportagem”.
A imagem ganha uma nova dimensão com o novo grafismo, já que anteriormente “muitas fotografias eram ‘estragadas’ com títulos ou manchas [de cor]”. “Agora o que interessa é que a fotografia marque a diferença na notícia ou no trabalho de reportagem”, afirma, o que implica “uma política de escolha de fotografias”.

Os objectivos do novo 24 Horas

800 mil foi o número de exemplares que na passada segunda e terça-feira o 24 Horas colocou nos quiosques de forma gratuita, dando a conhecer aos leitores a sua operação de renovação. Nesta nova fase os responsáveis diminuíram em dez cêntimos o preço de capa do jornal, para os actuais 75 cêntimos de segunda a quinta-feira, 1 euro à sexta e os 1,25 euros nas edições de fim-de-semana. Será que serão medidas suficientes para assegurar a futura sobrevivência do jornal? Pedro Tadeu mostra-se optimista.

“O jornal-revista tem qualidade por si próprio para se impor”, acredita o responsável. Dada a recessão e a potencial quebra de investimento dos grupos em marketing, “o tempo em que o suporte do marketing funcionava como motor de venda dos jornais vai acabar”, acredita. “Os produtos têm que se valer cada vez mais pela qualidade editorial que têm. Penso que o 24 Horas vale por si”, assegura. Na opinião de Pedro Tadeu o título tem capacidade para manter o nível de “vendas do ano passado, o que permite uma rentabilidade boa do 24 Horas”.

É que, frisa Pedro Tadeu, a nova estrutura e grafismo permitem “poupanças, só de produção na ordem de um milhão de euros”. Poupanças que permitem contrabalançar a perda de receitas, a manterem-se os actuais níveis de venda do jornal, e a diminuição do preço de capa. Apesar de não adiantar valores de facturação, Pedro Tadeu também acredita que o novo 24 Horas vai surgir como um produto mais atractivo para os anunciantes até aqui bem mais arredados em termos de investimento do diário do que de outros matutinos. Para aumentar o goodwill das marcas, os responsáveis eliminaram os classificados ‘relax’. Apesar deste tipo de anúncios ainda representar um “montante relevante” na receita do 24 Horas, o responsável considera não se coadunar com o novo posicionamento. “O jornal tem uma imagem melhor, mais atractiva para os anunciantes. É uma imagem capaz de atrair leitores com maior capacidade de consumo”, justifica.

Texto de  Ana Marcela

in Meios & Puiblicidade, 8 de Maio de 2009

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