Talvez fosse boa altura para Paulo Portas pensar na reforma. Ele trabalha desde os anos 70 e, suponho, a sua precoce visão de estadista (aquela onde levanta ligeiramente o olhar por cima das cabeças da multidão, observando, fascinado, o horizonte...) certamente o impediu de fazer batota nos descontos para a Segurança Social.
Sim, Portas só tem 51 anos mas vai pelo menos com 36 de carreira contributiva (dizem que começou a trabalhar aos 15) e um brilhante currículo a identificá-lo como jurista, jornalista, professor universitário, líder de uma empresa de sondagens e político.
O grande profissional que conhecemos somou qualquer coisa como uma quinzena de anos de deputado, foi eleito para o Parlamento Europeu e nomeado três vezes ministro. Recebeu, durante quatro anos, senhas de presença nas reuniões do Conselho de Estado. Ainda deu palpites no Conselho Superior de Segurança Interna e no Conselho Superior de Segurança Nacional. Não é para todos.
As biografias lembram, claro, a direção com Miguel Esteves Cardoso de O Independente, depois de ter passado por outros jornais. Um deles (informa circunspecta a Wikipédia) chamava-se Pelo Socialismo, era órgão oficial da JSD e pugnava, nesse tempo da primeira adolescência do vice-primeiro-ministro, pela "abolição da sociedade capitalista em prol do socialismo democrático, num repúdio pelo neocapitalismo e pela estatização burocratizante" como regista, complementarmente, o site dos jotinhas.
Dessa memória marxista nada lhe resta, está definitivamente arrumada num sótão dos tempos, catalogada com os erros juvenis de uma geração inteira de políticos de direita.
O problema é outro. É o da fotografia do homem vociferador contra o cisma grisalho de há cinco meses. Essa lembrança não o larga. Tal como a falhada demissão irrevogável. Ou a pífia promessa de voz grossa à troika. Já para não falar do desmentido, quinta-feira, de novas medidas de austeridade para 2014.
Agora Paulo Portas explicou-nos a sua escolha: foi entre espoliar velhinhos ou dar o golpe em viúvas. Preferiu, mal por mal, a segunda hipótese. Como dilema moral é patético...
Sim. Mesmo com a antecipação das reformas proibida por este Governo até ao final do programa de ajustamento, tenho a certeza de que haverá uma porta qualquer para Portas sair - afinal, se a presidente da Assembleia da República conseguiu uma pensão de sete mil euros por dez anos de trabalho no Tribunal Constitucional, uma carreira como a do líder do CDS-PP certamente dará direito a qualquer coisa de jeito, mesmo em tempos de crise, mesmo com os atuais cortes.
Era um bem para ele, político moribundo, e para o País, que agoniza.
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