O processo Casa Pia mostrou quanto é permeável a justiça à pressão política, à pressão dos jornais e à pressão das televisões. O processo Casa Pia revelou toda a debilidade crónica do Ministério Público. O processo Casa Pia demonstrou que políticos, advogados, juízes, procuradores, polícias e jornalistas dormem na mesma cama da traficância informativa. O processo Casa Pia provou a inutilidade do segredo de justiça. O processo Casa Pia entregou-se ao destino de quadrilheiros.
O processo Casa Pia disse-nos que os "interesses" ultrapassam em muito as clássicas alianças políticas ou de negócios. O processo Casa Pia, em contrapartida, historia também que a política e os negócios se metem em tudo, até na procura de violadores de menores. O processo Casa Pia ilustrou como Portugal nunca quis
saber do destino de crianças abandonadas à sua própria sorte.
O processo Casa Pia exemplificou: para conseguir fins nos quais têm fé, nem as boas pessoas olham a meios. O processo Casa Pia explicou o óbvio: por detrás de cada justiceiro está sempre um doido sem escrúpulos. O processo Casa Pia lembrou: quem vive do corte de cabeças de outros, quem é carrasco, não pode ser um inocente.
O processo Casa Pia obriga-nos a desconfiar de todos os outros processos judiciais: "Apito Dourado", corrupção em várias autarquias, Freeport, "Operação Furacão", Portucale, sei lá que mais. O processo Casa Pia faz-nos sorrir, levemente, de triste ironia, quando alguém põe a hipótese de se investigar em Portugal suspeitas de pedofilia na Igreja Católica. Vimos tudo isso com o processo Casa Pia mas sabemos que nada se alterou ou vai alterar-se, nada aprendemos ou iremos aprender, nada vai melhorar.
O julgamento do processo Casa Pia está a chegar ao fim. Ao fim? Não. Seja qual for a sentença dos juízes que há cinco anos tentam destrinçar alguma verdade no meio da enorme confusão que enfrentam, iremos ter recursos da decisão do tribunal. Arrastar-se-á, por muitos e muitos anos, uma residual luta judicial, longa e penosa.
É também mais do que certo que o País, depois da histeria colectiva do início, não vai gostar dos próximos desenvolvimentos. Os portugueses não vão gostar da hipotética condenação dos acusados, nem, contraditoriamente, gostarão da possibilidade de os ver ilibados. Até sobre as supostas vítimas persistem as maiores dúvidas. Já ninguém acredita em nada, já ninguém, aliás, quer de facto saber como este assunto vai terminar.
O processo Casa Pia valeu a pena?... Não.
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