Marinho e Pinto não está sozinho

Marinho e Pinto envolveu-se numa polémica com António Martins, o juiz que lidera a associação sindical da classe, espantoso defensor da extinção da Ordem dos Advogados e que justifica medida tão drástica por a instituição não ter procedido disciplinarmente contra o advogado Ricardo Sá Fernandes.
Este, por sua vez, criticara o Tribunal da Relação de Lisboa por ilibar o empresário Domingos Névoa. Fê-lo dizendo a seguinte frase: "Sendo a maioria da população portuguesa complacente com a corrupção, não estranho que haja sectores da magistratura complacentes com a corrupção."
O bastonário dos advogados, por seu lado, acusa neste tom: os juízes desautorizam as leis que deviam aplicar, protegem-se uns aos outros, não são zelosos, faltam ao respeito a advogados, testemunhas e
arguidos; têm privilégios a mais, não aceitam críticas, e, tal como os magistrados do Ministério Público, não deviam organizar-se em sindicatos.
Marinho e Pinto é recorrentemente acusado de ser um incendiário que espalha gasolina na floresta de problemas da justiça. Prova-se, no entanto, que a tendência para despejar um jerrican atestado de combustível em cima de pequenas fogueiras é partilhada por quase todos os dirigentes da área. Quem diz Marinho e Pinto, dos advogados, dirá António Martins, dos juízes, João Palma, dos magistrados, ou mesmo Pinto Monteiro, Noronha de Nascimento, Cândida Almeida, Maria José Morgado e uma enorme lista de doutores atraídos pelo abismo da fama.
No caso em apreço parece - as notícias não são totalmente esclarecedoras - que a investigação se baseou numa escuta que originou uma acusação cuja pena pode ir até aos cinco anos de cadeia. Em tribunal, no entanto, enquadraram-se os factos num outro crime, com pena que só vai até seis meses. Como as escutas são proibidas para provar crimes inferiores a três anos de cadeia, todo o edifício acusatório ruiu.
Este será um exemplo da incapacidade estrutural da justiça para condenar casos de corrupção. E sempre que envolvem escutas, então, é limpinho - sai tudo em liberdade.
O que há a fazer? Mudar os limites de permissão para escutas, correndo o risco de violar direitos de cidadãos suspeitos de crimes pouco graves? Mudar a forma como os actos associados à corrupção estão classificados na lei? Subir o valor das penas? Não sei, não sou jurista. Sei é que nada disso parece interessar os especialistas, estes mesmos incendiários a quem entregámos os destinos da nossa justiça. Resta-nos, então, sorrir e deixar arder, enquanto eles discutem tontices…

in Diário de Notícias, 27 de Abril de 2010






Sem comentários:

Enviar um comentário