Ninguém é objectivo no futebol

O jogo de futebol mais bonito que vi na vida foi ainda numa televisão a preto e branco. Trata-se do Itália-Brasil do Mundial de 1982. A selecção canarinha tinha Zico, Sócrates, Falcão, Júnior, o pior guarda-redes do mundo, Waldir Peres, e um ponta-de-lança gigante e infantil, Serginho. A Itália tinha Dino Zoff, um guarda-redes de 40 ou 41 anos, que defendia tudo sem sair de entre os postes, uma defesa de betão e um avançado que só foi bom naquele Mundial, mesmo assim o suficiente para entrar para a história do futebol: Paolo Rossi.

O Brasil, dizem os entendidos, apresentou naquela altura uma das melhores, senão mesmo a melhor equipa de todos os tempos. Eles pareciam os globe-trotters do futebol, a trocar os olhos aos adversários. Eram tão bons, tão bons, que se podiam dar ao luxo de jogar só com 9, pois o guarda-redes e o ponta-de-lança não contavam...

Pois, eram uma maravilha, mas quem marcou três golos na baliza do Brasil foi Paolo Rossi e o Zoff só foi buscar a bola ao fundo das redes duas vezes.

Desde 1982 que espero viver no futebol 90 minutos tão completos de arte, força, garra e geometria como aqueles. Já estive perto, mas nunca se repetiu.

Mesmo assim, o melhor jogo de futebol que já vi na vida não foi este. Há um que teve mais que, simplesmente, qualidade: há um que mexeu com o meu coração. Foi o Inglaterra-Portugal do Europeu de 2000 com a espectacular reviravolta do 2-0 para 2-3 que Figo e companheiros conseguiram.

O futebol é isto: a magia só se completa se à arte, à força, à garra, à geometria se juntar a camisola, o adepto. É por isso que em Portugal o melhor jogo de futebol de sempre terá de ser um jogo com uma equipa portuguesa. O Itália-Brasil, sim, foi muito lindo, mas o Inglaterra-Portugal foi divino.

in 24horas, 10 de Dezembro de 2005

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